SOBRE "ONDE PARAM OS ANJOS"

Por Filipa Ribeiro da Cruz

 

Permanece sempre uma interrogação subjacente aos olhares curiosos que sobrevoam o título deste meu primeiro livro, um romance com laivos de policial. Onde param os Anjos não me surgiu com um ponto de interrogação, mas somente enquanto uma clara afirmação.

Onde param os Anjos incita, pois, à reflexão sobre o universo existente dos Anjos, de que se tratam afinal essas figuras celestiais, e enfim o seu paradeiro ou, porventura, o porquê do seu quase sumiço neste mundo de feras. É a partir do título que se explica a génese, a intriga, o cariz das personagens por mim criadas.

Esta história surgiu-me, ainda com as raízes por fortificar, quando os dezasseis anos estavam a algum tempo de se concretizarem. Primeiramente, pensei numa personagem que iria marcar o bem face ao mal, representado pela segunda personagem da trama. Fui escrevendo as primeiras páginas e, assim que dera pelo engenho da criação literária, percebi que aquela história teria de se centrar num crime. Claro, existem panóplias de crimes; mas era como se já só, para mim, existisse um cuja índole me massacrava o intelecto, a partir daqueles instantes em que estava regida pela força dos acontecimentos ficcionais.

E eis que, no seio de uma idade em que comecei a refletir, a procurar respostas e a questionar-me incessantemente acerca dos porquês de tamanha crueldade humana, me assomou à escrita os crimes de violação dos direitos humanos e tráfico humano.

Claramente que estas cenas de crime me despertaram (e continuam a despertar) um interesse de cunho algo justiceiro, já que desde sempre detestei a sobreposição dos mais fortes face aos mais débeis, situação vincadamente traçada ao longo deste meu romance.

Bianca Cortês aparece, assim, como uma justiceira que, todavia, não pretende ser assim chamada, porque a sua personalidade não condiz com nomes heroicos. Maria Watson, por outro lado, surgirá enquanto o seu exemplo do que pior pode ter uma pessoa, lutando contra os ditames daquelas classes que ostracizam as ditas inferiores.

Todavia, a história de Onde param os Anjos, a par do seu aspeto mundano, da dicotomia ser/parecer, da miséria forçada de uns para deleite de outros, é também um drama familiar, um drama pessoal, um drama que acaba por pertencer ao mundo. Bianca, enquanto jovem, irá ter de batalhar, debater-se com extremas adversidades, decidir qual o caminho que irá escolher na encruzilhada na qual se verá trancada, sem meios de dali escapar. Tudo isso enquanto a existência lhe é madrasta, confrontando o tempo até aos últimos momentos possíveis, dando a entender que todos os minutos de uma vida devem ser vividos na plenitude, concretizando os sonhos e combatendo os dissabores.

Creio que este livro pode ser descortinado enquanto um romance de caráter policial, social e de intervenção, numa atmosfera de drama, traduzido na imensidão humana em melindrosa condição, as extremidades da pobreza e riqueza, mas essencialmente aparece, a quem lê, enquanto um livro de também uma jovem rapariga, que pretende dar a conhecer e chamar o mundo à razão quanto às atrocidades que, em pleno século XXI, continuam a fazer do mundo um lugar de díspares posições, marcadamente cruéis.

Por fim, e regressando à questão simbólica do nome dado a esta história, enquanto sua autora, apenas posso apelar à reflexão profunda dos que possam ler estas palavras: a diferença entre o amor e a esperança, a maldade e a vingança, leva a que sonhos de árduo alcance finamente se concretizem. No âmago de uma dimensão tragicamente avassaladora, poderá o leitor no meu livro desvendar, afinal, em que lugar param os Anjos, interpretando esta história enquanto um enigma que se resolve numa possível lição de vida.